terça-feira, 7 de outubro de 2014

Rio Piancó


Rio Piancó o Oráculo do Sertão

Rio Piancó, mais que um milagre da vida que renasce de tempos em tempos, constituiu-se no oráculo maior da história de Itaporanga. Com água ou sem água este colossal oráculo que ri com nossa alegria maior o “inverno” e sofre com nossa tristeza mais profunda a seca é a maior testemunha ocular de nossa história. 

Quem primeiro sofreu com as secas junto com o velho Piancó e se regozijou com suas cheias foram às nações indígenas que se desenvolveram em suas margens os índios que habitavam o sertão paraibano os tapuias, divididos em cariris e tairairiús. A região do Vale do Piancó habitada pelos índios curemas, icós e piancós. Viviam numa simbiose harmônica homem/ natureza como legítimos donos da terra e por que não dizer, nossos ancestrais culturais e até mesmo, em alguns casos, genéticos. Dos índios, como nos fala Gilberto Freyre, “... é que veio (...) o anseio pessoal. A higiene do corpo. O milho. O caju. O mingau. O brasileiro de hoje, amante do banho e sempre de pente e espelhinho no bolso, o cabelo brilhante de loção (...) reflete a influência de tão remotos avós”. Índios que sofreram quando o rio Piancó foi atravessado ou navegado por homens brancos como o Domingo Jorge Velho e os Theodósio de Oliveira Ledo.

Os bandeirantes de Domingos Jorge Velho, trouxeram para o sertão da Paraíba escravos negros derrotados e aprisionados em Palmares, utilizados contra os indígenas que resistiam por tempos, depois os negros fugiram do cativeiro e deram origem aos primeiros quilombos sertanejos. 

Moldando-se assim nossa índole e valentia sertaneja nas gêneses de cor índia e negra, quando o velho Piancó assistiu a suas águas serem manchadas de sangue nas batalhas colônias de luta pela terra.

Os anos passaram-se e em meados do século XVIII, a margem direita do velho rio já se podia falar em um pequeno vilarejo que os mais velhos chamavam de Misericórdia Velha. A vida no pequeno vilarejo se estabeleceu junto com o curral de seu donatário Antônio Vilela de Carvalho, pertencente à freguesia de Piancó, que havia sido fundada em 1739. No pequeno vilarejo se produzia melaço e rapadura nos engenhos, se cultivava milho e feijão e principalmente criava-se gado bovino nos currais, gênese de nossas origens históricas. Diferente de hoje, o gado era criado solto, sem cercas, pastavam livremente pela propriedade daí o surgimento da figura do vaqueiro para fazer a apartação dos mesmos – origem da tal culturalmente importante festa de vaquejada.

As primeiras casas eram de taipa, baixas com portas longas e cacimbas próximas, por volta de 1840, moradores do povoado que havia sido fundado por Antônio Vilela em 1765, atravessam o velho oráculo Piancó e, na sua margem esquerda, com pedra e argila erguem um dos símbolos do cristianismo, uma pequena igreja e ao seu redor começa a nossa história urbana com a construção das primeiras casas. A capela é construída sobre a invocação de Nossa Senhora da Conceição de Misericórdia, sendo o arraial fundado por três colonos e um padre: Alexandre Gomes da Silva, Joaquim Carnaúba, João Madeiro e padre Lourenço. Com o tempo o local passou a ser conhecido como Misericórdia e pela lei no 05 de 11 de julho de 1860 o arraial foi desmembrado de Piancó e passou a freguesia: Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Misericórdia. Com uma área que lembrava um feudo europeu, pois naquela época Itaporanga abrangia terras que iam de sua localidade a Conceição.

Itaporanga não diverge das outras cidades do sertão no seu desenvolvimento e formação, desde a aquisição de terras por Antônio Vilela em 1765, a construção da primeira capela erguida em homenagem a Nossa Senhora da Conceição, em 1840 ao arraial da então vila de Nossa Senhora da Conceição de Misericórdia. Sua evolução passou pelas etapas: aldeias – bandeira – curral – fazenda – arraial – vila – cidade.

Ao entrarmos no início século XX, por volta de 1910, temos a descrição do saudoso historiador Celso Mariz a cerca da cidade onde ele nos dizia numa previsão otimista: “município futuroso, onde se faz intenso trabalho agrícola nas abas e planos da Serra Grande e nos baixios lavados pelo Piancó e minúsculos afluentes. È grande aí a colheita do algodão, do milho, do feijão e do arroz, especialmente nas paragens banhadas pelo riacho de Nova-Olinda (...) a industria pecuária, se não é tão importante como no Piancó, mesmo na relatividade do espaço da população tem entretanto elevado número de indivíduos”.

O nome Misericórdia seria substituído em 1938, por intermédio do então interventor municipal Praxedes Pitanga, para Itaporanga – que significa do tupi-guarani Pedra Bonita. Cinco anos depois, em 1943, o município voltou a chamar-se Misericórdia, permanecendo assim até janeiro de 1949, quando voltou definitivamente a chamar-se Itaporanga. A querela de nomenclatura significava uma disputa política entre Eduardo Gomes e Praxedes Pitanga, políticos locais de influência na época.

O município possuía aquela época, vasta área territorial, que perderia a partir do final da década de 1950, no então governador Pedro Moreno Godim, com a criação dos municípios de Pedra Branca, Curral Velho, Diamante, Serra Grande e São José de Caiana. Antigas povoações de Misericórdia. O processo urbanístico da cidade também ganhou novos rumos por esta época, quando Pitanga construiu seu casarão (na atual sede da secretaria estadual de educação), surgindo as avenidas Getúlio Vargas e Pedro Américo (atual Soares madruga), levando, com o tempo, o centro cidade para longe da velha capela e do olhar do velho Piancó.

A cidade hoje possui uma população que gira em torno dos 21 mil habitantes e um comércio dinâmico e se caracteriza como pólo na região e título de nobreza: Rainha do Vale do Piancó. Farta feira que mais que aspectos econômicos ainda trazem aspectos culturais que facilmente poderiam ter inspirado Sivuca nas suas poesias:

“Fumo de rolo arreio e cangalha 
Eu tenho tudo pra vender, quem quer comprar 
Bolo de milho broa e cocada 
Eu tenho pra vender, quem quer comprar 
Pé de moleque, alecrim, canela 
Moleque sai daqui me deixa trabalhar 
E Zé saiu correndo pra feira de pássaros 
E foi pássaro voando em todo lugar 
Tinha uma vendinha no canto da rua
Onde o mangaieiro ia se animar 
Tomar uma bicada com lambu assada 
E olhar pra Maria do Joá.”

E o futuro? Como será o amanhã? Estas páginas misteriosas eu deixo para vocês escreverem com suor, sabor e sonhos que só quem é do sertão sabe expressar. A certeza? Esta fica no velho Piancó que estará lá, calmo, seco ou transbordando a observar e a olhar por todos nós que fazemos e somos a história de Itaporanga.


Ouro Preto do oeste – Rondônia 17/05/2005

Lourival Inácio:

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