domingo, 5 de outubro de 2014

Miericórdia / Itaporanga - O Livro de Bosco Gaspar


O PRIMEIRO LIVRO

A chegada dos pioneiros

De como se deu a conquista do interior paraibano, a partir de ordens dos dirigentes da Casa da Torre, donos de terras da Bahia ao Maranhão, passando pela fundação de Misericórdia, a sua emancipação política, até chegar aos dias atuais quando Itaporanga ostenta a condição de cidade mais importante do Vale do Piancó.

A ocupação dos sertões

Como a maioria das cidades nordestinas, Misericórdia, hoje Itaporanga, a mais próspera cidade do Vale do Piancó, cuja religiosidade é representada por uma estátua do Cristo Redentor, a segunda maior do Brasil e terceira do mundo, nasceu a beira de um rio, e em torno de uma capela. Antônio Vilela de Carvalho, um desbravador português, chegou a região por volta de 1765, após comprar aos D’Ávila, fidalgos da Casa da Torre, representantes reais residente na praia do Forte, na Bahia, uma grande faixa de terra, onde construiu uma casa de morada e um curral para a criação de gado, à margem do Rio Piancó. Ali, anos depois, começou uma pequena povoação que depois passou a ser conhecida como Misericórdia Velha, já que os primeiros habitantes do lugar atravessaram o rio e foram fixar-se na outra margem, onde construíram uma pequena Orada que consagraram a Nossa Senhora do Rosário, a exemplo do que fizeram os moradores de Pombal e Piancó, as primeiras povoações e cidades do sertão paraibano, que ainda conservam as velhas igrejas que tem essa denominação. Aliás, o nome de Misericórdia advém do fato de ter sido doada pela Santa Casa de Misericórdia de Portugal a pequena Imagem da Virgem que ainda hoje se encontra na Igreja de Itaporanga. 

A ocupação dos sertões da Paraíba foi confiada a família de Antônio de Oliveira Ledo que conquistou esse direito junto a Casa da Torre, símbolo maior dos Garcias D’Ávila, nobres portugueses donos de uma vasta Sesmaria que ia da Bahia até o Maranhão. Na segunda metade do século VXII, por volta de 1679, uma expedição, com 60 homens, partiu de Massacará, na Bahia, para explorar o interior paraibano. Chefiada por Antônio de Oliveira Ledo, a comitiva era integrada por Pascásio de Oliveira Ledo, Theodósio de Oliveira Ledo, Francisco Pereira de Oliveira Ledo, Felipe Rodrigues (filho de Pascásio), e Antônio de Oliveira Ledo Neto (filho de Francisco Pereira). Eles seguiram pelas margens do rio São Francisco até a altura de Santo Antônio da Glória, onde alcançaram o rio Pajeu, e logo depois transpuseram a Serra da Baixa Verde, em Triunfo, Pernambuco, conseguindo finalmente ingressar em terras da Paraíba. 

Os exploradores chegaram até a confluência dos rios Piancó  e Piranhas, onde hoje se localiza o município de Pombal, mas logo retomaram a Bahia, ficando por aqui apenas Theodósio e seus homens que, por três anos, fizeram diversas incursões pela área. Por volta de 1682, o capitão-mor dos vales do Piancó e Piranhas, título que lhe foi concedido pelas autoridades da Colônia, viaja para o cariri paraibano. Nesta ocasião acontece à revolta dos indígenas da região sertaneja, movimento que ficou conhecido como Confederação dos Índios Cariris. Theodósio regressa ao sertão, captura alguns índios da tribo Arius e viaja para Salvador, Bahia, onde tem uma audiência com o governador Soares de Albuquerque, a quem faz um relato da situação e mostra a necessidade de povoar o interior paraibano e iniciar a criação de gado em toda a área, no que foi prontamente atendido, regressando então para o Vale do Piancó à frente de uma grande expedição e com muito gado. 

Anos depois, já bastante velho e cansado, Theodósio deixa definitivamente os sertões de Piancó e Piranhas, indo fixar-se no cariri paraibano. Suas terras e o seu comando passaram então para as mãos do comendador Gaspar D’Ávila Pereira, que foi incumbido de limpar a região e, para tanto, teve que travar sangrentas batalhas com os índios Cariris, principalmente os das tribos Pêgas, Panatis e Coremas, sendo que a esta última comunidade pertencia o guerreiro Piancó (Terror, na língua nativa), cujo nome foi emprestado a região, graças a sua bravura e o destemor com que enfrentava o inimigo. Segundo a maioria dos historiadores paraibanos, os antigos ocupantes das terras sertanejas foram praticamente dizimados pelos conquistadores, mas ofereceram brava resistência à presença dos colonizadores, grande parte deles vindos das terras banhadas pelo São Francisco, nos territórios da Bahia, Alagoas e Pernambuco e que receberam grandes datas de terras e títulos reais como recompensa pela conquista, ocupação e povoação do interior paraibano, desde os contrafortes da Borborema até o sertão de Piranhas, passando pelo Vale do Piancó. 


A povoação de Misericórdia

A resistência oferecida pelos homens primitivos da região não durou muito tempo. Afinal os desbravadores eram mais adestrados, organizados e possuíam armas de fogo, como bacamartes e espingardas, que causaram pesadas baixas ao inimigo. Partindo de Pombal alguns aventureiros fundaram algumas léguas acima, numa fazenda de gado do capitão-mor Manoel de Araújo Carvalho, um lugarejo que deu origem ao município de Piancó. Foi vindo de Pombal, e com autorização de Gaspar D’Ávila, que o sertanista Antônio Vilela de Carvalho ocupou as terras das margens esquerda do Rio Piancó, onde implantou o sitio Misericórdia, e construiu um curral, algumas casas de taipa e uma pousada para os viajantes e tropeiros, situação que perdurou por muitos anos. 

Algum tempo depois, Joaquim Fonseca, também conhecido por Joaquim Carnaúba, João Madeiro, Alexandre Gomes da Silva e Padre Lourenço, moradores do sitio Misericórdia, atravessaram o rio e na outra margem construíram algumas casas. Trataram também de ocupar as terras em torno do pequeno lugarejo. Carnaúba ficou com a gleba que compreende a Várzea do Saco e outras porções, Madeiro com o Cantinho, os Gomes com a Misericórdia Velha e padre Lourenço tratou de negociar entre eles a demarcação de uma área para a construção de uma capela dedicada a Virgem do Rosário. O local é o mesmo onde hoje se encontra a Igreja de Nossa Senhora do Rosário e foi escolhido por Madeiro, que era muito religioso, e que desejava, segundo se conta, ver a Capela todo dia, logo cedinho, da janela da casa que construiu e onde morou no alto onde foi construído dezenas de anos depois o Colégio Diocesano “Dom João da Mata”. 

Escolhido o local para a Capela, de imediato foi erguida uma Cruz de Madeira, sentada em uma base de pedra, simbolizando o poder divino. A pequena igreja logo foi construída, um pouco atrás, e em torno dela foram levantadas às primeiras moradas. Com o passar do tempo novas famílias chegaram ao pequeno povoado, agrupando-se nas ruas periféricas à Capela do Rosário, tornando o lugarejo, em poucos anos, numa vila bastante desenvolvida, integrando o município de Piancó, um dos mais importantes do sertão paraibano, cujas terras iam de Pombal até Conceição, na fronteira com o Ceará. 

Já com um bom comércio e muitas moradias, Misericórdia prosperou e a sua excelente localização a transformou num centro comercial que atendia aos habitantes de uma larga faixa de terras, e servia de pouso e passagem obrigatória dos tropeiros que com suas mulas abasteciam os sertões de mercadorias que a terra não produzia, como tecidos, miudezas, calçados, sendo que muitos deles gostaram tanto do lugar que se fixaram na terra, constituíram família e ficaram em Misericórdia para sempre. 

A emancipação política

A vila de Misericórdia ganhou a sua emancipação política, desligando-se de Piancó, no dia 11 de dezembro de 1863, através da Lei Provincial 104, mas a instalação oficial do município só aconteceu no dia 09 de janeiro de 1865, quando aconteceu a designação dos seus primeiros dirigentes. A cidade permaneceu por sessenta e três anos com o seu nome de origem, mas em 1938 passou a chamar-se Itaporanga, que em tupi-guarani significa “Pedra Bonita”, graças ao Decreto-Lei Estadual número 1164, de 15 de novembro, por interneviência do interventor municipal Praxedes da Silva Pitanga.

Em 1943, contudo, por conta do decreto-lei Estadual número 520, o município voltou a chamar-se Misericórdia, denominação que permaneceu até o dia 07 de janeiro de 1949, quando, pelo Decreto Estadual 318, voltou definitivamente a ser Itaporanga, também por decisão de Praxedes Pitanga. Dez anos depois, por conta de lei votada pela Assembléia Legislativa e sancionada pelo então governador Pedro Moreno Gondim, Itaporanga perdeu grande parrte do seu território, que era um dos maiores do Estado, com a criação dos municípios de Pedra Branca, Curral Velho, Boa Ventura, Diamante, Serra Grande e São José do Caiana. 


A situação geográfica

Situada na mesorregião do sertão paraibano, Itaporanga possui uma área de 481,8 quilômetros quadrados, limitando-se ao norte com os municípios de Aguiar e Igaracy, ao sul com Diamante, Boa Ventura e Pedra Branca, ao leste com Piancó e Santana dos Garrotes e a oeste com São José do Caiana e Serra Grande. A sede do município está situado a 289 metros de altitude e apresenta um relevo formado por superfície elaborada em rochas cristalinas, dissecadas sob a forma de colinas alongadas, denominadas de Serras do Cantinho, Santa Rita, São Pedro e Saquinho e dos Serrotes de Tapuio, Lage, Vermelho, Riachão e Cruzeiro. A bacia hidrográfica é formada pelos afluentes do Rio Piancó. 

De clima tropical megatérmico e semi-árido, a temperatura média anual em Itaporanga é elevada, oscilando entre 29 e 32 graus. As máximas não chegam aos 35, devido a ação refrescante dos ventos alísios. O regime de chuvas, quando é o caso, ocorre de janeiro a maio, com maior concentração entre fevereiro e abril. A sua vegetação é formada, basicamente, por Pereiros, Imburanas, Mufunbo, Jurema Preta, Marmeleiro, Xique-Xique. O solo dispõe de minerais bem desenvolvidos, de consistência friável e firme, moderados a bem drenados e susceptíveis a erosão, apresentando cascalhos na superfície. 

João Bosco Gaspar

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