sábado, 15 de novembro de 2014

Luiz Benedito


Luiz Benedito de Oliveira nasceu na cidade de Itaporanga, no dia 20 de março de 1935 e era filho de Pedro Benedito de oliveira e Martins de Sá, é primo do cantor e compositor Alventino Cavalcante autor da música "Canto da ema" gravada por Jackson do Pandeiro. Viveu toda sua adolescência em Bonito de Santa Fé, onde aprendeu o ofício de alfaiate e deu os primeiros passos musicais. A música estava no sangue: quatro dos seus cinco irmãos também dedicaram-se à arte musical, entre os quais sargento Antônio Benedito (também já falecido e pai de Sandoval Moreno), regente da banda de música criada pelo prefeito de Itaporanga, Abraão Diniz, uma das primeiras do município.

“Na década de 50, entre 55 e 56, Luiz foi para o Rio de Janeiro, e lá trabalhou como alfaiate e também na música, se apresentou em várias rádios e fez muito sucesso lá”, comenta Sebastião Benedito, irmão de Luiz e também músico: “nesse CD que iria lançar tem uma marcha minha, e também tem música de Edmilson Pinto e Pedro Môco, e música dele próprio também”, completa Doba, como popularmente é conhecido, ao lembrar a genética musical da família, de onde saiu muita gente talentosa, e entre os mais famosos, ele cita o primo, que morou durante muito tempo em Itaporanga, Alventino Cavalcante, compositor do “Canto da Ema”, gravado por Jackson do Pandeiro.

Luiz Benedito é egresso do tempo das serestas românticas, das bandas de bailes e das orquestras de carnaval, que embalavam as ruas de Itaporanga. “Eu cantei com Luiz mais de 30 anos, e o que aconteceu só os desígnios de Deus pode explicar”, comenta o cantor e carteiro Nilton Mendes.


A geração musical de Luiz e Edmilson Pinto precede a de Radegundis, que é o grande divisor de águas. Com este, a música de Itaporanga deixa os limites do município e o autodidatismo, conquistando valiosos espaços na academia e nos palcos do país inteiro: é o tempo de Sandoval, Gilvando, Roberto e muitos outros que permanecem brilhando, mas, ao mesmo tempo, abrindo espaço para uma nova safra.

Casado com a conterrânea Josefa Francisca dos Santos, dona Zefa e o casal teve os seguinte filhos: Alex, Ana Nery, Anália, Iara Débora, Luiz Benedito Jr. Luiz Benedito nos deixou em um trágico acidente automobilístico próximo a Itaporanga, onde vinha participar da abertura do sesquicentenário da padroeira de Itaporanga  e lançar seu CD, produzido e com arranjos do músico Radegundis Feitosa Costa. O corpo de Luiz foi sepultado, em meio a grande comoção, no Cemitério Mãe de Misericórdia.

O fato

Radegundis e seus companheiros de sexteto saíram de João Pessoa, onde residiam, para abrilhantar a festa da paróquia de Itaporanga com um show do sexteto de trombone, o grupo com o qual o instrumentista itaporanguense se apresentava nos mais importantes palcos do mundo.

Traria para sua terra o melhor e lançaria aqui mais um CD: acostumado aos aplausos das mais seletas platéias do planeta, queria também os aplausos de seus conterrâneos e ser grato à Igreja da qual ele e a maior parte do seu grupo eram frutos. Nasceram da filarmônica Cônego Manoel Firmino, uma das obras culturais mais importantes do padre José Sinfrônio de Assis Filho.

Os seis músicos dividiram-se em dois carros: Radegundis seguia na frente e com ele viajavam Roberto, Adenilton e Luiz Benedito, que já saiu de João Pessoa com o grupo. Ao passarem por Piancó, os músicos decidiram visitar um companheiro (o conhecido maestro Nêgo Lula) e nesse ínterim, o carro com a outra parte do sexteto passou: Sandoval, Rogério e Gilvando chegaram primeiro a Itaporanga e ficaram aguardando os colegas, mas o que chegou foi a notícia da tragédia. “Nós chegamos em Itaporanga e ficamos esperando, foi quando soubemos que tinha havido o acidente, mas eu pensava que não era nada grave, e só quando cheguei no local foi que me deparei com a tragédia, uma coisa que ninguém imaginava e até hoje eu custo em acreditar”, comenta Gilvando Pereira da Silva. Um outro integrante do sexteto, conterrâneo e amigo de Radegundis desde o Ginásio Diocesano, Sandoval Moreno de Oliveira, além do tio Luiz, perdeu um companheiro da vida inteira e permanece profundamente abalado.

Ao passar pelo trecho da BR-361, que corta o sítio Roça de Cima, município de Piancó, já próximo ao limite com Itaporanga, Radegundis perdeu o controle do seu carro, um Citröen c4, placa NPT 5510, que saiu da pista e capotou violentamente, indo parar às margens da estrada, onde, em poucos minutos, foi consumido pelo fogo. Não houve sobrevivente: seus quatro ocupantes morreram carbonizados. Um deles, Luiz, foi arremessado para fora do veículo durante a capotagem, mas caiu próximo ao carro e também foi queimado.

A principal testemunha do acidente, um comerciante de Itaporanga, foi ouvido pelo delegado de Piancó, José Pereira, um dia após o acidente. Conforme o delegado, o homem disse que trafegava a 130 quilômetros quando foi ultrapassado pelo carro dos músicos e, minutos depois, deparou-se com a tragédia: o veículo sendo consumido pelo fogo e fora dele um corpo também tomado pelas chamas. Populares ainda tentaram socorrer o homem com extintores de incêndio, mas ele não resistiu.

De acordo com o delegado, outras pessoas que passaram pelo local minutos depois do acidente disseram ter visto jumentos nos arredores, o que reforça a hipótese, segundo dr. Pereira, de que o músico perdeu o controle do carro ao tentar desviar de um animal.

A testemunha também disse ter ouvido gemidos provenientes de dentro do veículo, mas não havia como prestar socorro às demais vítimas por causa, segundo ele, da grande intensidade do fogo e da rapidez com que as chamas se propagaram, destruindo o carro e tudo que estava dentro dele em poucos minutos. Mas alguns objetos dos músicos, que caíram do carro antes da combustão, foram recuperados: um laptop de Radegundis, um trombone do grupo e uma quantia em dinheiro de Luiz foram recuperados. E tudo mais terminou em cinzas.

Os corpos dos músicos ficaram desmontados e ficaram irreconhecíveis. Levados para o Instituto de Medicina Legal de João Pessoa, precisaram passar por exame de arcada dentária para serem identificados e depois entregues às famílias. Dos três itaporanguenses, dois, Luiz e Roberto, foram sepultados em Itaporanga. Radegundis foi cremado em um crematório de Cabedelo e as cinzas jogadas ao mar. Já Adenilton foi sepultado em Igaracy, sua terra.

Radegundis: o melhor do país 

O primeiro doutor em trombone do Brasil era também um dos três melhores do mundo. Mestrado na The Juilliard School de Nova York em 87 e doutorado na The Catholic University of American de Washignton em 91, Radegundis era atualmente chefe do Departamento de Música da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Comandava a escola onde um dia foi aluno.

Como professor de música da UFPB por 25 anos, Radegundis formou uma geração de músicos, mas foi além da sala de aula: montou grupos de metais que ganharam destaque no país e no mundo, a exemplo do quinteto Brassil e do sexteto Brazilian Trombrone Ensemble, com o qual realizou apresentações marcantes na Europa e nos Estados Unidos. Também construiu uma carreira solo, com apresentações por todo o país e fora dele, conquistando prêmios nacionais e internacionais.

Trombone principal da orquestra sinfônica da Paraíba e com participação marcante na Sinfônica da Bahia, o maestro também criou e integrava a sinfônica Norte/Nordeste. Gravou importantes trabalhos com o quinteto e sexteto de trombone e também como solista, entre os quais Trombone Brasileiro em parceria com a pianista Maria Teresa Madeira, e o disco Radegundis Feitosa & Camerata Brasílica, onde demonstra toda sua genialidade musical. “Gravamos também com a sinfônica Norte/Nordeste e, uma coisa da qual eu me orgulho muito, foi o disco da sinfônica da Paraíba, uma coisa marcante na minha carreira, porque o primeiro CD com a orquestra sinfônica do Brasil foi gravado na Paraíba”, disse Radegundis em entrevista para um documentário radiofônico produzido pela Fundação José Francisco de Sousa em 2008.

Um dos grandes defensores da música, criou e presidiu a Associação Brasileira de Trombone, surgida em 1995 em Brasília para defender não apenas a classe, mas a música como um todo. Foi destaque em algumas das principais mídias mundiais, entre elas a TV Globo (Programa do Jô) e BBC de Londres, além de sua constante presença nas mais variadas publicações musicais aqui e no exterior.

E pensar que Radegundis saiu de Itaporanga no final da década de 70 com o propósito de ser engenheiro civil, seguindo os passos profissionais do pai, Heleno Feitosa Costa (já falecido), um construtor regional, mas que também sabia edificar boas notas musicais.

E ao chegar em João Pessoa, o filho de Costa descobriu uma escola musical e não pensou duas vezes: a paixão pela música falou mais alto e ele seguiu a carreira do coração. Teve receio de contar ao pai sua escolha, já que na época a música não era uma atividade muito valorizada profissionalmente, mas encontrou apoio em Heleno Feitosa, que, no fundo, era o principal responsável pelo apego de Radegundis ao trombone.

Na infância, a brincadeira dele era com um velho piston do pai. Trombonista autodidata, Costa tinha uma orquestra de carnaval chamada Unidos do Vale, que brilhou na década 60 em Itaporanga e região, e vendo o interesse do filho pela música, contratou o maestro de sua orquestra, Edmilson Pinto, para dar aula a Radego, como carinhosamente era chamado pela família.

“Eu tive uma base muito boa, que é o que falta a muita gente, e isso graças, primeiramente, ao professor Edmilson Pinto, e depois à filarmônica Cônego Manoel Firmino”, diz Radegundis no documentário.

O músico desaparece aos 48 anos: uma morte violenta e precosse, mas seu legado é imorredouro. Os grupos que criou, os discos que gravou, as dezenas de músicos que formou e toda luta em defesa da música erudita resultaram em valiosos frutos para o presente e para o futuro.

E Radegundis ainda tinha muitos projetos, e quase todos passavam pelo departamento de música da universidade federal, que ficou arrasado emocionalmente com a morte do seu líder maior: alunos e professores foram às lágrimas. O próprio reitor da universidade, Rômulo Pollary, disse que será muito difícil substituir Radegundis no departamento de música e que a UFPB perdeu um dos seus melhores quadros.

Radegundis, que embarcaria no dia 2 de julho, depois de retornar de Itaporanga, para Campos do Jordão, em São Paulo, onde participaria do festival internacional de música erudita, evento que se realiza há 40 anos, deixou esposa e dois filhos, um com 16 (Ramon) e o outro com 22 anos. Radegundis Filho, o mais velho, já é professor de música e atua no Rio Grande do Norte. O músico também deixou duas filhas de um outro relacionamento.

Se toda Paraíba comoveu-se com o fim trágico do grande maestro, imaginem sua família: Zacarias Feitosa é o único irmão biológico de Radegundis residente em Itaporanga e foi o primeiro a chegar no local do acidente. Diante da cena, uma dor para toda a vida. Dor também para sua esposa e filhos, para seus irmãos, dois dos quais Costinha e Bobó, também são músicos, e, principalmente, para sua mãe, dona Joanita Feitosa, hoje também residindo em João Pessoa e já com uma idade avançada.

A família decidiu pela cremação do corpo de Radegundis atendendo um pedido dele próprio manifestado anos atrás durante os funerais de um professor do trombonista. “Ele falou que um dia quando morresse também queria que seu corpo fosse cremado e as cinzas jogadas no mar”, disse emocionado Zacarias à reportagem da Folha.


Mas em Itaporanga muita gente lamentou: queria que, pelo menos, parte do velório tivesse sido realizado na cidade, da qual o músico era filho e onde está sepultado o seu pai, para despedir-se do conterrâneo ilustre. “Eu disse por todo canto, se o velho Costa fosse vivo, o corpo de Radegundis tinha vindo para cá”, disse Edmilson Pinto, primeiro professor do músico. 

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