terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Um bairro inteiro sem uma gota d’água e o drama particular de um dos seus moradores

O sofrimento de um homem e de sua comunidade


O agricultor itaporanguense Pedro Curinga está sentindo na pele a dor da humilhação e da impotência, sentimentos  comuns a muitas pessoas pobres deste Vale quando procuram seus direitos nos órgãos públicos e não são atendidos. A começar pelo básico: água para beber, coisa rara no bairro que mora, o Balduino de Carvalho, um dos mais populosos de Itaporanga, mas onde a Cagepa não chega.

Se já é de difícil enfrentar as caras feias e insensíveis nos departamentos burocráticos dos governos quando a saúde está em plena vitalidade, muito pior é quando o corpo já não responde aos anseios da mente e pede tempo, implorando para parar.

Pedro Curinga começou a viver essa triste realidade quando procurou a agência local do INSS. Mesmo com a saúde abalada por problemas cardíacos e psicológicos, teve o pedido de um auxílio doença negado várias vezes pelo órgão federal. Assim como, mesmo sem condições físicas, tem procurado às autoridades para resolver o problema da falta d’água em sua comunidade, mas também sem êxito. Os direitos individuais e coletivos não são respeitados.

A Previdência só veio acobertá-lo quando a Justiça reconheceu o seu legítimo direito ao benefício. Antes, porém, penou em clínicas particulares de João Pessoa fazendo exames que comprovassem sua doença e a inaptidão para o trabalho. Mas o outro problema, a água, ou melhor, a falta dela, continua sem solução.

O agricultor está amparado pela Previdência há quatro anos, mas vive temeroso de perder o benefício depois que a própria Justiça determinou recentemente que ele se submetesse a mais uma perícia médica. O exame está marcado para o próximo dia 26 na cidade de Piancó. “Meu coração diz que eu vou perder esse benefício, o médico não me conhece e não vai dar certo”, diz emocionado Curinga em contato com a reportagem da Folha.

Ele revela que o salário mínimo que recebe é o seu único meio de vida. “Com esse dinheiro, eu pago aluguel, alimentação, energia e metade dele é gasto só com medicamentos”. E ainda tem que comprar água particular para não morrer por outro mal: a sede.

Um problema crucial - Não bastassem as amarguras enfrentadas pela doença, a questão da água tem provocado muita dor de cabeça no agricultor. E, nesse aspecto, ele não é o único que sofre com o problema.

Há seis meses, após ficar viúvo, Pedro Curinga foi morar no bairro Balduino de Carvalho, uma das comunidades urbanas de Itaporanga que mais sofre com a falta d’água, o que o tem deixado muito aperreado.

A situação da comunidade é tão precária que as pessoas são obrigadas a comprar água a um particular para não morrerem de sede. “Já tenho procurado a Prefeitura para, pelo menos, colocar água duas vezes por semana no bairro porque a situação está difícil, não aguentamos mais”, afirma Curinga. Apesar dos apelos, nenhuma solução apareceu.

A falta d’água no Balduino de Carvalho e em outros bairros periféricos da cidade é provocada pela ineficiência do sistema adutor de Itaporanga, o que resolveria com a ampliação da rede de abastecimento d’água do município.

As obras voltadas para essa finalidade tiveram início no ano passado no governo Maranhão, mas foram paralisadas meses depois por falta de interesse político.

Sem esposa, sem pai, sem mãe, sem filhos, sem posses, sem ter seus direitos respeitados e sem água, Pedro Curinga desabafa: “Pobre é como cachorro, ninguém respeita”.

Mas apesar das portas fechadas, o agricultor continua lutando para que os direitos individuais e coletivos não fiquem apenas nas páginas da Constituição Federal. Foto: Pedro Curinga, um dos milhares de rostos sofridos deste Vale.

Publicado pelo Folha do Vale em 18-03-2011

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